quarta-feira, 25 de março de 2020

Casa do Camponês

Hoje trago-vos a “Casa do Camponês”, também por muitos conhecida como a “Casa das Bonecas”. As poucas informações que consegui juntar foram, na sua maioria, através de cartas que encontrei na residência.  

 Nesta habitação vivia um casal, Maria Amélia e Mário Verdelheiro,  com as suas duas filhas, Maria Luisa, a mais velha, e Maria Ligia, à qual a maioria das cartas eram endereçadas. A filha mais velha do casal nasceu a 9 de Junho de 1969, portanto se ainda for viva, terá agora 50 anos. O pai era camponês e possivelmente algum dos membros do agregado familiar tivesse alguma ligação a panificação, visto ter encontrado alguns registos no local, mas trata-se apenas de uma suposição 

Voltando às cartas, que me transportaram para uma realidade já praticamente inexistente, caída em desuso e que nos fez perder todo esse encanto que era a expressão limitada por tempo/espaço e por isso mais intensa, impactante. A ansiedade de receber aquele pedaço de papel que nos fazia sentir mais perto das pessoas, sensação essa que hoje não se aplica, pelas variadíssimas formas de comunicação. Mas tão banalizada, que se perdeu um pouco dessa magia, pelo facilitismo. Deparei-me com 12 postais e uma folha com um poema, que se traduziam em cartas de amor de um rapaz de seu nome Paulo José Beja, para a Maria Ligia, a filha mais nova. A primeira com a data de 21 de Abril de 1984. Nessa altura a Ligia teria 14 anos, como referido nessa carta. Pelo que percebi, o Paulo ia passar férias no parque de campismo da Trindade, em Lagos, todos os anos, com a sua família, contando, no que redigia, todas as suas peripécias nesse período e a falta que sentia da sua amada. Um amor adolescente, mas inspirador, confesso. 

Descobri também um cheque no valor de 10.000$00, assinado por Norberto Henriques Beja (que julgo estar relacionado ao Paulo, pelo sobrenome), direccionado ao Mário Verdelheiro, com a data de 25 de Setembro de 1962 

Sei que existiam outros registos, cartas e fotografias na casa, incluindo um álbum, mas alguns já não se encontravam presentes e outros mais tarde percebi que não tiveram a devida atenção. Deixo-vos então um pouco do que vi. 
















































sábado, 21 de março de 2020

Complexo Turístico do Muxito



Em tempos de isolamento e de máxima contenção, aproveito para vos trazer algo já muito por vocês conhecido. O Complexo turístico do Muxito, inserido nos pinhais antigamente pertencentes à Infanta D. Isabel Maria, filha de D. João VI, em Vale de Gatos (motivo pelo qual o logotipo é um gato), na freguesia da Amora, foi um empreendimento de grande relevo económico e social para o concelho do Seixal. 

Constituído por um hotel com 60 quartos, um apart-hotel, campos de ténis, 13 vivendas, duas piscinas, sendo que uma delas foi a primeira piscina olímpica em Portugal, com uma prancha de 10 metros, que infelizmente já não se encontra no panorama. No Complexo também poderíamos encontrar uma discoteca, um centro hípico, um bar de apoio à piscina, uma pequena praça de touros, dois restaurantes (um na entrada e outro no último piso do hotel), uma estação de serviço rodoviário, um posto de abastecimento e um lago artificial, onde os hospedes podiam praticar actividades como barco a remo. Tinham também a oportunidade de percorrer e explorar os vários hectares do terreno através de motas que eram disponibilizadas pelo hotel. 

Este complexo inaugurado a 23 de Maio de 1957 pertencia a uma empresa de seu nome Lino&Zimbarra. Teve o seu pico de fama durante as décadas de 1950 e 1960, sendo algo mais direccionado para as classes mais endinheiradas. O facto de se encontrar junto à Estrada Nacional 10, que ligava Lisboa ao Alentejo e Algarve, também poderá ter ajudado a potenciar essa popularidade (antes da construção da ponte 25 de Abril, em 1966). Era muito habitual equipas de futebol, tanto nacionais como internacionais, se dirigirem a estas instalações, quando tinham jogos na margem sul do Tejo. Em 1973 Zimbarra faleceu e nesse mesmo ano a empresa declarou falência. Li que um dos sócios tinha negócios paralelos, e esses sim, levaram este complexo à ruína. Foi adquirido em leilão por uma cadeia hoteleira, dirigida por uma empresária jugoslava, Gordana Bayloni, que avançou com obras no complexo, para melhoramento do espaço. Inclusive, contratou um arquitecto francês, Jacques Couëlle, que desenvolveu um projecto que incluía a construção de outro hotel, mais vivendas e de um centro comercial, que seria o primeiro grande espaço deste género em Portugal. Nada se realizou. Manteve-se estagnado, mesmo com um vultuoso investimento, por razões que não consegui apurar.  

A 7 de Março de 1975, foi invadido e ocupado por grupos revolucionários de extrema esquerda, FSP (Frente Socialista Popular) e LUAR (Liga de Unidade e Acção Revolucionária), que se apropriaram do espaço. Como este caso, existiram tantos outros de roubo e apoderação neste distrito e noutros, como se tornou habitual nesta época. Esta ocupação deveu-se, principalmente, ao facto deste complexo estar representado naquela altura como um ícone da classe alta. Foi formada a Comuna Che Guevara, que servia de apoio social à comunidade, funcionando como um mercado de venda directa entre os agricultores e os consumidores, cantina e infantário. A piscina foi aberta ao público. Estava tudo direccionado para a população, até que pouco tempo depois o complexo começou a ter outro propósito. Foi montado um campo de treino para os militares, sendo que até chegou a ser palco de combates e negócios obscuros e manteve-se esta situação até à expulsão, em 25 de Novembro de 1975, pela ameaça de conflito armado com o Grupo dos 9. O infantário continuou aberto até 1977. O restaurante que se encontra à entrada também se manteve aberto, sendo alugado por diversas vezes. Desde essa data que este espaço está em estado de abandonado. 

Em 1999, a proprietária do complexo, Gordana Bayoli faleceu, deixando a empresa detentora desta sociedade hoteleira, Lare-i-rá, para os seus herdeiros. Não consegui recolher informação que me fizesse precisar quem seriam, apenas que chegaram a expor algumas ideias, mas que nunca se vieram a concretizar. Entre elas, a rentabilização das moradias, para conseguirem gerar receita para reabilitar o complexo. As vivendas foram arrendadas no princípio da década de 2000. Não houve qualquer intervenção de restauro. 

Entretanto, algumas partes da propriedade foram aproveitadas e reabilitadas para outros fins, como é o caso do Complexo Municipal de Atletismo Carla Sacramento, espaço inaugurado em 2001, onde antigamente eram os campos desportivos do hotel.   

titulo de curiosidade, este espaço foi cenário do primeiro filme português de ficção científica, “RPG”, apresentado em 2013. 

  

Deixo-vos ainda um video, aquando da ocupação, em 1975, com as declarações de um membro da comissão de trabalhadores. Aparecem também alguns cenários de como era este espaço, nomeadamente da piscina, fachada do complexo turístico, sala de estar e sala de convívio e o interior de um dos restaurantes, no seguinte link:


















Imagens recolhidas ao longo da pesquisa: